Uma retrospectiva do Flash (1940-1989)

Texto publicado de Mark Waid publicado em Flash Annual #3 (1989) e republicado pela Editora Abril em Super Powers #22, agosto de 1991, tradutor não creditado









Não é preciso ser um cientista da NASA para entender por que o Flash, nas suas várias encarnações, sempre foi um dos personagens de histórias em quadrinhos mais populares, sem dúvida nenhuma, o mais bem-sucedido com apenas um tipo de poder. Tem a ver com identificação do leitor. Quem não gostaria de ser veloz como o vento? Os quadrinhos sempre foram povoados por personagens velozes, mas o maior (e melhor) nasceu em janeiro de 1940, quando a revista Flash Comics #1 chegou às bancas. Na realidade. uma antologia de diversos heróis, Flash Comics significou a estreia de personagens de fôlego e impulso tão grandes como Falcão da Noite (Hawkman), Johnny Trovoada e o Chicote. Mas a estrela era o corredor de vermelho e azul, Jay Garrick, mais conhecido como o Flash (Joel Ciclone no Brasil). Como foi explicado naquela primeira história, escrita por Gardner Fox e ilustrada por Harry Lampert, Garrick era um estudante universitário que acidentalmente derrubou uma proveta cheia de uma forma experimental de "água pesada". O liquido derramado desprendeu vapores que deixaram Garrick inconsciente, inalando a fumaça química a noite toda. No dia seguinte, ele descobriu que os gases haviam lhe dado o poder de se mover numa velocidade sobre-humana. Vestindo camisa e botas vermelhas, calças azuis e um capacete alado, ele transformou-se num caçador de aventuras disfarçado. Flash rapidamente tornou-se um dos principais personagens da DC. Em agosto de 1940, ele virou uma das estrelas da nova revista  All Star Comics e, no número 3, ele entrou para a Sociedade da Justiça, sendo considerado, no geral, um membro valioso durante todos os anos 40 até a equipe se aposentar. Em 1941, devido a exigências dos leitores, ele ficou sendo o primeiro herói da DC (fora Superman e Batman) a estrelar sua própria revista, batizada de All-Flash. E em 1942, Flash juntou-se à Mulher-Maravilha e ao Lanterna Verde como um dos personagens principais noutra antologia, a Comic Cavalcade.


                                                



Embora o trabalho artístico da série fosse pouco refinado até para a época, as histórias de Fox, Robert Kanigher, John Broome e outros eram inteligentes e engenhosas. Durante um certo tempo, inúmeros personagens memoráveis foram incorporados à série: vilões como o Tartaruga, Pensador e Espinho deram ao Homem Mais Veloz do Mundo algo em que se concentrar; em troca, ele foi ajudado, ou melhor, atrapalhado por um grupo de idiotas com boas intenções chamados Winky, Blinky e Noddy, e começou a acompanhar uma cientista chamada Dra. Fiura a vários países e tempos estranhos. No final dos anos 40, o trabalho artístico ficou por conta de ilustradores mais que competentes, como Joe Kubert, Lee Elias e até um jovem chamado Carmine Infantino. Em contraste a inúmeras outras HQs da época, que queimaram todo seu potencial no início e caíram no esquecimento, as histórias de Flash até melhoraram notavelmente com o rolar da década. infelizmente, a carreira de Flash, assim como a da maioria de seus colegas, começou a decair no fim dos anos 40. Histórias em quadrinhos de super-heróis estavam em baixa; All-Flash foi cancelada em 1948 na edição 32, no ano seguinte, com o número 104, e a Sociedade da Justiça, o último refúgio onde Jay Garrick poderia pendurar seu capacete alado, desapareceu em 1951 com o número 58 de All-Star, que passou a se dedicar ao gênero faroeste. O personagem entrou no limbo da HQ. Mas ele foi resgatado cinco anos mais tarde durante uma reunião de redação na DC. Alguns meses antes, a editora havia lançado um título experimental chamado Showcase; uma revista de ensaio para personagens e conceitos novos. Os redatores estavam atrás de uma história para o quarto número quando alguém sugeriu ressuscitar o Flash. O redator Julius Schwartz levou adiante essa ideia, mas não sem antes fazer o escritor Robert Kanigher dar novos ares ao personagem. Os poderes seriam os mesmos; tudo mais mudaria. O Flash era agora Barry Allen, um cientista da polícia de Central City que recebeu o dom da supervelocidade quando um raio atingiu uma estante em seu laboratório, derramando nele uma estranha combinação química eletricamente carregada. Allen, que havia sido um enorme fã e colecionador das aventuras em HQ de Jay Garrick, tomou o lugar de seu ídolo e transformou-se no novo Flash. Desde o início, ele foi um sucesso. Kanigher e seu colega de roteiros, John Broome, conduziram Flash durante quatro números de Showcase.
Showcase #4, outubro de 1956, estréia de Barry Allen, o segundo Flash







Wally West torna-se o Kid Flash em Flash #110
 Broome se tornou o argumentista principal do herói quando o Corredor Escarlate passou a ter sua própria revista, que retomou a numeração da antiga série Flash Comics, começando no número 105. A data de capa: março, 1959. Dois fatores importantes diferenciavam o Flash de outros combatentes do crime. O primeiro era urna tendência inventiva de Broome em relação aos criminosos uniformizados. Ainda nas primeiras aparições de Flash, Broome criou o que muita gente classifica como o mais interessante conjunto de inimigos que um super-herói poderia ter: Mestre dos Espelhos, Capitão Frio, Dr. Alquimia, Gorila Grodd, O flautista, O Mago do Clima, Joe Trapaça, Capitão Bumerangue e outros. Imediatamente, todos transformaram-se em importantes membros do Universo DC; todos eram grandes e memoráveis supervilões. Não houve um só fiasco em toda a turma. O outro fator era o desenhista das historias, o incomparável Carmine Infantino, originalmente um dos muitos desenhistas do Flash nos anos 40. Durante a década de 50, Infantino havia se estilizado muito, desenvolvendo um senso de design que é até hoje considerado um dos melhores no meio. E, em relação ao novo Flash, ele não só desenhou um homem que podia correr rápido; Infantino definiu o poder da supervelocidade nos quadrinhos com seu estilo leve e aerodinâmico. Broome e Infantino, juntamente aos arte-finalistas Joe Giella, Frank Giacoia, Sid Greene e Murphy Anderson, e o ocasional roteirista Gardner Fox, deram ao "Cometa Rubro" oito emocionantes anos de aventuras nas páginas de The Flash. Barry Allen arrumou um parceiro chamado Kid Flash no número 110 e um convidado especial permanente (mais tarde um super-herói por mérito próprio) chamado Homem-Elástico no número 112: ele encontrou seu xará (Jay Garrick) pela primeira vez no número 132; e até foi um dos primeiros super-heróis casados da DC ao se juntar à sua eterna noiva, íris West, em Flash 165. Mas a magia de Infantino não poderia durar para sempre.
Encontro os dois Flashs em Flash of Two Worlds, Flash #123,setembro de 1961
Quando, em 1967, a DC o promoveu ao cargo de Diretor de Arte, Infantino e o argumentista Schwartz entregaram as tarefas artísticas à antiga equipe da Mulher-Maravilha, formada por Ross Andru e Mike Esposito a partir de Flash 175. E, embora Andru e Esposito fizessem um ótimo trabalho, eles não podiam bater a longevidade de seu antecessor; o número 194 foi o último. Gil Kane veio dar unia mão desenhando do numero 195 ao 199, junto com os escritores Kanigher (que havia voltado quando Broome largou definitivamente a HQ no final dos anos 60) e Mike Friedrich. Flash 200, porém, foi um marco, não só por sua numeração, mas pela estreia do desenhista Irv, Novick, conhecido na DC pelas inúmeras histórias de guerra de anos anteriores e, mais recentemente, nas páginas de Batman. Novick ilustrou os próximos setenta números de Flash, o que fez dele o principal artista do herói nos anos 70. Mas essa constância não foi comparada a Cary Bates, um jovem argumentista que estreou no número 209 e, com exceção de uma edição feita por Dan Mishkin e Gary Cohn, fez os roteiros do restante da série, terminando 140 meses mais tarde com o número 350. Em 1979, Julius Schwartz entregou Flash a Ross Andru, que trabalhou com Bates, e ao novo desenhista efetivo Don Heck para dar um visual mais contemporâneo à revista. No passado, as aventuras de flash encerravam-se em um ou dois números, e havia pouca ou nenhuma continuidade na série; o Flash de 1979 não era muito diferente do Flash de 1959. Andru imediatamente mudou a situação redefinindo e enfatizando o trabalho de Barry Allen (isto é, explicando o que exatamente um cientista policial faria no seu dia-a-dia); introduzindo personagens coadjuvantes na série; e, o mais importante. fazendo a esposa de Barry, Íris, ser assassinada por um inimigo mortal de Flash, Professor Zoom (ou Flash Reverso), assim lançando nosso velocista num turbilhão emocional durante todo o ano seguinte até o instante em que ele traz Zoom à Justiça e começa a juntar os pedaços de sua vida. No número 284, Len Wein toma-se o novo escritor do herói, concluindo seu mandato ao fazer Carmine Infantino voltar na edição 296. Bates e Infantino formaram o time de criação pelo restante da duração da revista, passando até pela infame sequência "O Julgamento de Flash", uma série de histórias onde o herói é levado diante da corte de Central City para determinar sua possível culpa na morte do Professor Zoom, que havia tentado matar a noiva de Barry Allen, Fiona Webb, no dia do seu casamento. O fim dessa história marca o final da série; com uma agradável surpresa para todos, Barry Allen é exonerado de todas as acusações e reencontra íris, que, afinal, não estava morta. OtTítulo The Flash estava acabado, mas Barry Allen ainda tinha uma aventura pela frente, e ela foi contada nas páginas de Crise nas Infinitas Terras. o Flash sacrificou sua vida para impedir que o vilão Antimonitor destruísse a Terra. Seu falecimento foi lamentado por todos os super-heróis do planeta, mas marcou profundamente o protegido de Bany, West, mais conhecido como Kid Flash, que no desenrolar do evento adotou o nome e o uniforme de seu mentor, mantendo a tradição como o terceiro e atual Flash. Wally recebeu sua revista própria pouco depois: em 1987, Flash # 1 chegou às bancas e o editor Mie Gold, Mike Baron (argumento) e Jackson Guice (desenhos) apresentaram o personagem a uma nova geração de leitores. A série fez sucesso imediato e segue até hoje nas competentes mãos do escritor William Messner-Loebs e dos artistas Greg LaRocque e Larry Mahlstedt. Se esta terceira série vai aguentar o teste de tempo tão bem quanto suas antecessoras ainda está para ser confirmado, mas uma coisa é certa: enquanto houver histórias em quadrinhos, sempre haverá um Flash.






Leitura Adicional

Mario Luiz C. Barroso, Flash - Os Homens mais rapidos do Mundo!, Heróis do Futuro #10, Press Talent, 1995

DC 70 Anos 4 - Flash, Panini Comics, 2008

Coleção Super-Heróis Volume 1: Homem-Aranha e Flash, Editora Europa, 2016


A Complicada numeração das revistas americanas




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