Literatura pulp na poesia de cordel




No outro post, fiz uma relação entre os cordéis e os quadrinhos, indo desde o pioneirismo da editora Prelúdio (atual Luzeiro), até exemplos recentes da Maurício de Sousa Produções.

Revistas pulps foram revistas baratas criadas no final do século XIX, as revistas eram antologias e publicavam contos, novelas e romances seriados, o nome pulp tem origem no material utilizado, o papel de baixa qualidade feito de polpa de celulose (pulp em inglês), conforme já comentei aqui no blog, o pulp é um herdeiro de outras publicações populares como folhetins, penny dreadfuls (Reino Unido) e dime novels (Estados Unidos), sendo penny e dime, duas palavras para indicar uma unidade de valor monetário baixo, o centavo, cêntimo ou centéssimo. Enquanto pulp gerou as expressões pulp magazine (revista pulp), pulp fiction (ficção pulp) e literatura pulp. O nome cordel veio das cordas onde os folhetos eram amarrados, o que acabou gerando termos como literatura de cordel, poesia de cordel e cordelista, esse último para definir o poeta do cordel.


A primeira semelhança entre os muitos cordéis e os pulps é uso de papéis de baixo custo, embora possa existir cordéis com uma variedade de papéis de luxo (geralmente por grandes editoras, como Globo Livros, Melhoramentos, etc...). Outra semelhança é a presença de histórias de aventura, podendo abrigar a fantasia, a ficção científica, o terror entre outros gêneros fantásticos, na aventura, o pulp assimilou o faroeste dos dime novels e presente também nos cinemas e quadrinhos, o cordel costuma abordar cangaço (que pode até ter uma abordagem similar ao faroeste nos "nordestern"), mas ambos também podem explorar outros períodos históricos, inclusive o faroeste norte-americano. A diferença entre é ambos é que os pulps publicavam basicamente histórias em prosa e os cordéis são narrativas em versos, embora também tenham sido publicadas poesias em revistas pulps, é o caso de Ciméria de Roberr E. Howard, um poema sobre o lugar de origem de Conan, o bárbaro. O termo romance é mais conhecido para definir uma narrativa longa em prosa (sendo mais que o conto e a novela), contudo, existe também o romance poético-musical, usado nos cordéis.


Também no post anterior, eu comentei sobre a poesia épica ter origens na Antiguidade, tanto na Grécia Antiga, quanto na Idade Média, poemas e canções épicas foram criados para exaltar heróis reais e fictícios.


Tarzan de Edgar Rice Burroughs estreou em 1912 na revista All-Story Magazine, se tornou uma série literária que foi transportada para os cinemas, quadrinhos, televisão e outras mídias. O personagens inspirou diversas imitações, os chamados tarzanides e as garotas da selva. Os cordéis também não escaparam dessas influência, em 1947, João Martins de Athayde lançou A Filha das Selvas, que conta o romance de Guilherme com uma jovem criada na Africa chamada Laline. Ao pesquisar a capa, tive um palpite que poderia ser de um filme com a atriz americana Dorothy Lamour, pesquisando encontrei, veio de um poster de um filme chamado Her Jungle Love (1938), lançado no Brasil como Idílio na Selva, estrelado por Lamour e Ray Milland, o filme se passa na Oceania, com Lamour interpretando uma jovem adorada como uma deusa, o filme para aproveitar o sucesso de outra película estrelada pela dupla, the Jungle Princess (1936), o filme mostrava Lamour usando um sarongue, uma espécie de saiote malaio, sendo então chamada de Rainha do Sarongue, ela também usa o traje em The Hurricane (1937) e Road to Singapore (1940) com Bob Hope e Bring Crosby, uma paródia aos filmes sarongue.

Na pesquisa, encontrei um anúncio de storyboards do filme, mas ao que parece, eram tiras diárias, assinadas por Glen Cravath (que também fez uma tira do King Kong), é possível que tenha sido publicado como tira no pressbook, um tipo de jornal distribuído para os cinemas para promover os filmes. Em 1950, assim como aconteceu com Sabu Dastagir, a Fox Feature Syndicate lançou o gibi Dorothy Lamour, Jungle Princess, disponível para leitura no site Comic Book Plus


O cordel está disponível no acervo digital da Fundação Casa Rui Barbosa no seguinte link.






O próprio Tarzan estrelaria um cordel, Tarzan e a cidade de Ouro de Manoel Pereira Sobrinho publicado em 1955 pelo também cordelista Manoel Camilo dos Santos.  O título é uma alusão a um romance da série, publicado na revista pulp Argosy All-Story Weekly (uma fusão da Argosy com a All-Story) de 1 de novembro de 1931 e 7 de janeiro de 1932 e republicado como livro em 1933, no Brasil, foi publicado em 1940 na Coleção Terramarear da Companhia Editora Nacional com tradução de Azevedo Amaral, alguns livros da coleção foram traduzidos pelo escritor Monteiro Lobato, com capas de seus genro, Jurandir Ubirajara Campos. Lobato também traduziu The Jungle Book como O livro da jângal, trechos do livro foram reproduzidos na revista O Tico-Tico, já publicados aqui no blog. Consegui apenas um anúncio no cordel A Cigana Esmeralda de João Melchíades Ferreira da Silva, também editado em 1955 por Manoel Camilo dos Santos, disponível para leitura na Cordelteca do Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular no seguinte link


Por ora, não posso dizer é uma simples transposição de romance em prosa para a poesia de cordel ou se teve algum mudança do cordelista. 






No site Dailymotion, é possível assistir a uma adaptação animada, no primeiro e no sexto episódio da série Tarzan, Lord of Jungle da produtora americana Filmation, que podem ser assistido nesse link.










Em 1960, a Editora Prelúdio publicou A Marca do Zôrro de Manoel D'Almeida Filho, como o nome indica, é uma versão do popular personagem Zorro de Johnston McCulley, personagem estreou em 1919 no romance "The Curse of Capistrano" (A Maldição de Capistrano) publicado em cinco capítulos na revista All-Story Weekly. O romance chegou nas mãos do ator e diretor Douglas Fairbanks, que lançou no ano seguinte o filme The Mark of Zorro, adicionando novos elementos como a roupa preta e a marca do Z feita com uma espada do tipo rapieira. O sucesso do filme deu origem a continuações escritas por McCulley e posteriormente, outros, filmes, quadrinhos, animações, etc...



O cordel pode ser lido no acervo digital da Fundação Casa Rui Barbosa, disponível no seguinte link. Em 2018, a Luzeiro republicou o cordel no formato original (13, 5 x 18 cm, 64 páginas), disponível para compra no site oficial da editora.


Curiosamente, a editora publicava os quadrinhos de Juvêncio, o justiceiro do sertão, baseado uma série da Radio Piratininga de São Paulo, que basicamente transportava as histórias do Velho Oeste para o Nordeste brasileiro, a ideia não era nova, em 1953 havia estreado Jerônimo, o Herói do Sertão criado por Moysés Weltman, Radio Nacional do Rio de Janeiro. enquanto Jerônimo teve filmes, telenovelas e quadrinhos,  o gibi do Juvêncio tinha roteiros de Gedeone Malagola, Helena Fonseca, R. F. Lucchetti,  Fred Jorge e Reinaldo Santos (produtor da série) e desenhos de o Sérgio Lima, Rodolfo Zalla, Eugênio Colonnese e Edmundo Rodrigues. Eugênio Colonnese e Sérgio Lima também faziam capas dos cordéis pra editora.





Em 2011, um novo cordel de Tarzan foi publicado, A Lenda de Tarzan - O Rei da Selva do cordelista e repentista piauiense Joaquim da Matta, o cordel foi publicado pela editora Lamparina, a capa é oriunda de uma revista em quadrinhos, cuja autoria ainda não foi descoberta. Não encontrei muito sobre o título, mas é possível comprar através da Tupynanquim Editora de Klévisson Viana através de seu blog oficial.
                                               
Tarzán #406, México, 1976, Editorial Novarro 
Ver também
RPGs inspirados na literatura de cordel

Fontes e referências
Dorothy Lamour - Wikipédia em inglês

Tarzan e a cidade de ouro - Wikipédia em português

Sete mitos sobre a literatura de cordel brasileira

Editora Luzeiro - Um estudo de caso

A Estrella da Poesia: impressões de uma trajetória

O Pulp em solo nacional e a relação do leitor com as revistas de emoção

Hibridismo e interferência pulp nos códigos técnicos e na linguagem visual das revistas de emoção brasileiras 



Os Pulps Brasileiros e o Estatuto do Escritor de Ficção de Gênero no Brasil

Depoimento - O cordel como ferramenta auxiliar na sala de aula

Tarzan - Companhia Editora Nacional




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